Memorias de um ano

Pouco tempo atrás, coisa de um mês ou dois, comecei a escrever uma dessas cartas que aqui se vê - destinadas a mim mesma - remoendo a angústia de me sentir, apesar de todo o esforço, ainda nauseada e incompleta. Eram palavras sobre a angústia de ainda ter de confrontar uma incompletude vem me preenchendo insistentemente e irritantemente, apesar do tanto de vida que vivi nos últimos meses - muito mais do que vivi nos últimos anos.

Silêncio. Interrompi. Apaguei as poucas linhas escritas. Não quis pensar sobre isso. Não quis externar a dor evidente, lancinante e arrastada que eu gostava de fingir não ver que estava sempre presente em mim, às vezes por fora, como um corpo que me abraça, às vezes por dentro, como um ser vivo que tenta rasgar meu corpo para escapar em busca de ar livre.

Então veio esse momento que é sempre tão importante para mim: quando eu venho escrever sobre o ano - os 365 últimos dias que tive e a forma com a qual arrastei meu corpo sem alma ao longo deles. Sempre sem vida. Sem cor. Sem viço.

Silêncio outra vez. Faltaram palavras.

No meio de pizza surpresa, bolo red velvet, terapia, tatuagem e muitas garrafas de vinho, a Náusea perdeu o caminho das minhas entranhas e me deixou quase em paz. Então eu pude sorrir enquanto pensava sobre os dias que passaram e me senti como as outras pessoas se sentem quando olham em retrospecto e percebem que a vida acontece e é vivida.

Não tem texto de fim de ano esse ano porque eu quero me agarrar a tranquilidade de perceber que tive dias agitados, coloridos, cheios de afeto e de cuidado. Eu não sei quanto tempo essa sensação dura, portanto, irei aproveitá-la.



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