Vinte-e-quatro-de-fevereiro de dois-mil-e-vinte-e-um

Há anos eu escolhi não comemorar meu aniversário. Porque eu nasci no meio do feriado favorito desse país. Bem na melhor época do ano. Em dia de felicidade. De bebedeira. De beijo na boca.
No carnaval.

Eu sei, portanto, que não adianta tentar competir: na escala de importância das coisas, o Carnaval sempre ganha. Nem tento! Deixa o aniversário para lá! Não é importante!

Eu adoro dizer isso. Adoro dizer que não ligo. E falar pra todo mundo fazer suas coisas e ser feliz em minha homenagem. Afinal, eu sou o próprio Carnaval encarnado (apesar de não sair no carnaval)! Me adorem!

Mas é mentira. Eu realmente sei que na escala das coisas, bebedeira e beijo na boca sempre vencerão a comemoração de aniversário de uma pessoa desajustada que tem formas desajustadas de se divertir e muita dificuldade de divertir e entreter os outros.

Mas, apesar de saber disso - e tendo um longo histórico de festas de aniversários vazias e esperas eternas por pessoas que nunca chegarão no bar -, se eu cismasse de fazer alguma comemoração eu ignoraria o óbvio e começaria a acreditar no meu desejo. Acharia que - talvez, quem sabe - as pessoas quisessem estar lá. Começaria a pensar nas conversas e nos abraços. Faria planos.

E, marcada a comemoração, ninguém avisaria previamente a ausência. Porque as pessoas não costumam dizer as coisas que nos machucam, mesmo que devam. E por não avisarem, eu fingiria não saber que ninguém estaria lá. E me encheria de expectativas. E depois me frustraria. E ficaria triste. Porque eu sou dessas pessoas que, apesar de saber das coisas, finge que não sabe porque o desejo é muito mais gostoso do que a realidade. Aí a realidade vem e eu sou só tristeza.
Há anos eu decidi não competir contra o carnaval para não me deixar levar por esses desejos improváveis. Porque não quero inventar motivos para ficar triste depois.

Há anos decidi apenas esperar que aqueles por quem tenho afeto estejam felizes aproveitando o feriado prolongado da forma que mais lhes causar prazer. Isso, entretanto, não me livra da melancolia - e eventualmente alguma tristeza - do vinte-e-quatro-de-fevereiro solitário de todo ano.

Diferentemente do que todos esperávamos (ou gostaríamos), ainda estamos em um cenário pandêmico em 24 de Fevereiro de 2021. Isso faz com que, mesmo que eu resolvesse lutar contra a indisponibilidade das pessoas em fevereiro - porque o carnaval dura fevereiro inteiro, caso não saibam -, comemorações de aniversário seriam impossíveis. Eu já previa isso desde o ano passado e achei que, pela prática adquirida com todos os verões vividos, eu estaria pronta, firme e em paz para esse trinta-e-dois-anos solitário. Seria só mais um aniversário vazio.

Mas isso não aconteceu.
E eu me sinto mais melancólica, solitária e triste do que nos 31 anos anteriores.

Tá tudo esquisito. No mundo do lado de fora e no mundo do lado de dentro. E a solidão plantada e cultivada em 2020 me agarrou em 2021 e tem me lembrado diariamente que eu estou partida e que meus mil pedaços estão espalhados por aí, desbotados pelo tempo e eu não sei como recuperá-los, colá-los e restaurar suas cores.

E apesar de eu fazer parecer - e eu acho que sou boa na arte de enganar todo mundo - que sou inquebrável, a realidade é o avesso. Eu estou despedaçada, caminhando sem rumo, a procura de distrações para não lembrar que não sei onde estou ou onde achar resgate. E aniversários sempre parecem post-its colados no espelho, me alertando sobre as coisas que eu tento esquecer e não sentir. Um alerta para - pelo menos um dia no ano - eu não poder esquecer que estou despedaçada, perdida e só.

Despedaçada, perdida e só... Mas ainda grata por não desistir. Porque todo dia ganho é uma oportunidade de encontrar uma trilha de pão. Torcendo para isso acontecer amanhã, porque a busca está ficando cansativa. Torcendo para que os pássaros já não tenham comido todo o caminho de farelos que pretendo usar para me orientar.


Comentários

  1. Desejo-lhe um dia bom,
    Uma boa noite de sono,
    E sonhos amenos,
    Desejo-lhe paz,
    Momentos de tranquilos,
    E bons pensamentos,
    Desejo lhe recordações felizes,
    verdadeiras ou falsas mas que acalantem seu espirito.
    Em comemoração por mais um verão
    Desejo-lhe.

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