Me falta tanto ainda. E tá quase tudo bem.

Estou desde a entrada deste ano de 2019 pensando no texto que deveria publicar quando eu atingisse, enfim, os meus trinta anos. Era preciso fazê-lo, claro! Não seria possível deixar passar em branco a data em que - convencionou-se - o humano contemporâneo não teria mais permissão ou qualquer possibilidade de adiar a vida adulta, porque ela cairia no seu colo como um bebê largado pela cegonha. Trinta anos é fatídico. É coisa importante demais. Tem um quê de mistério, tem um pouco de fim. Um pouco de começo. De peso. De medo.

É o que convencionou-se.

Então, por uma semana - a semana que antecedia o esperado dia - me sentei diante do computador com o intuito de discorrer alguma coisa de muita qualidade sobre o dia do aniversário que se aproximava, além de alguma outra notável obra literária sobre a transição para a vida adulta que se realizaria no primeiro segundo da inauguração do 10.950º dia da minha vida.

Mas aconteceu de, durante essa semana, eu acabar tendo algumas outras atividades urgentíssimas a serem realizadas antes de eu poder dispor tempo e concentração para a mencionada importante tarefa. E durante sete dias, eu acabava determinando que antes dos textos havia ligações, e-mails, planos, projetos, artigos, organização de dia seguinte e uma série de outras atividades inadiáveis.

E essa semana que antecedia o meu vinte-e-quatro-de-fevereiro passou. E a tarefa não fora realizada. E eu estava cansada e ocupada demais para realizá-la mesmo com atraso. Considerei compor um texto que abordasse a virada do ano junto da virada dos trinta. Ainda haveria tempo: o ano só realmente começa depois do carnaval  e - olha que coincidência! - meu aniversário acontece bem no carnaval. Haveria tempo para as tarefas urgentes, tempo para o descanso e tempo para a escrita.

E então passou mais de um mês. E não havia nenhum texto. E eu ainda não tinha tempo ou vontade de centrar minha atenção nessa atividade que já me parecia muito boba.

Não tive tempo para a minha grande estreia no palco da maturidade. Não tive tempo para pensar na lista que criei de coisas que deveria realizar até os 30 - mas que eu não risquei nem a metade porque fui achando que uma parte dos itens era uma grande bobagem e a outra parte era um monte de coisas que eu não sentia a menor vontade de fazer.

Também não tive tempo de pensar nas bobas expectativas que eu deveria estar criando para o futuro, nem de sentir ansiedade pelos problemas que viriam a partir de agora - certamente maiores, porque problema de adulto é sempre coisa grande: não haveria mais espaço para dor de cotovelo.

Não deu tempo para criar personagens bobos e glamourosos para eu incorporar - todos baseados em De Repente 30 - e não deu tempo para ficar frustrada porque não consegui encarná-los, já que não estou nem perto de sê-los, ou de querer sê-los. E ainda não me sobrou tempo para me permitir perceber que quase nada mudou com a vinda da terceira década. Tirando um pequeno detalhe. Um detalhezinho muito pequenininho, quase desprezível diante da magnitude do evento sobre o qual eu deveria tratar.

Trinta anos é fatídico. É coisa importante demais. Tem um quê de mistério, tem um pouco de fim, um pouco de começo, de peso e de medo - é o que convencionou-se. Só que eu não ligo.

Foi então que me ocorreu um bom motivo para eu me sentar aqui e tecer uma meia dúzia de palavras bobas sobre uma coisa muito boba que é fazer aniversário de trinta anos: eu tenho estado muito ocupada sendo muito eu para me ocupar de inventar coisas para eu desejar ser. E eu tenho vivido demais para ter tempo de escrever sobre a vida que eu estava vivendo demais para ter tempo de escrever sobre. Aí me sobrou tempo para perceber que quase nada mudou com a vinda da terceira década e finalmente pude vir aqui escrever algo.

Quase nada mudou, tirando o pequeno detalhe de que eu quase sei perfeitamente quem eu sou e tô quase bastante satisfeita. E por isso eu não ligo para quase nada. E quase não me caem culpas no colo. E quase não me cabem rancores no peito. E eu quase consigo entender todas as minhas bobagens. E quase sou tolerante com as bobagens dos outros também. E quase não ligo se nada disso estiver fazendo qualquer sentido no próximo aniversário.

Quase nada mudou tirando o fato de que eu já me importo muito pouco com convenções e imagens públicas. Que eu quase já não caio mais em lorotas inventadas para vidas em que não caibo e nem sonho sonhos que não são meus. E que quase muita coisa vivida em trinta anos fez muito sentido.

E quase nada mudou, tirando a percepção de que a vida adulta, o autoconhecimento, o universo da maturidade, o fim do direito de ser boba não me tiram o gozo e o interesse por bobagens nem os sonhos adolescentes.
Só que agora as costas doem.
E nem para isso eu tenho realmente ligado.

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