Carta sem destinatário

É fácil escrever sobre você. Guardei seus olhos e o jeito de falar exatamente o que eu quero ouvir. As risadas e o sorriso manso de canto de boca. Os elogios eternos. Toda essa sedução deleitosa e infinita que nos abraçou.

Você vai sempre fazer parte de mim e eu nunca te esquecerei. E vou abrigar eternamente tudo o que vivemos com doçura, mas amarei principalmente aquilo tudo o que não vivemos. O que ficou nas entrelinhas, o que ficou na insegurança, na boca dos outros... No medo adolescente, que não cresce nunca, de agir errado e te perder para sempre.

Engraçado como estivemos sempre exatamente no mesmo lugar, distando apenas alguns metros, sentindo o perfume um do outro, mas mesmo assim invisíveis. E como mesmo invisíveis nunca nos perdermos de vista.
Como você podia estar sempre tão perto, tão ao meu alcance sem eu jamais tê-lo tocado assim com entusiasmo? Por que não antes nos encontramos pelo cheiro? Por que os toques foram tão superficiais? Por que nossos segundos passaram tão depressa?

Discorrer essas palavras e todo este melodrama é demasiadamente fácil.
Está tudo espalhado entre fios de cabelo e carinhos nas pontas dos dedos. É só revisitar as memórias e colar aqui sem editar. E misturar com as nossas peculiaridades, cuidadosamente preservadas e guardadas como um segredo, prontas para serem trazidas à realidade quando precisarmos.
Eu nunca saberei por que nos escondemos.
E eu nunca te esquecerei.

Todas as histórias do passado que não existiu e do futuro que não aconteceu, inexplicavelmente depois de todos estes anos, estão finalmente incomodando de forma significativa.
Nós nunca tivemos um ao outro e eu não conseguirei dizer por quê.
E eu sempre fui tão sua sem saber, mas ficou tudo perdido entre bolas, balas, sol, álcool e em uns poucos segundos de felicidade diluídos em anos de história compartilhada.
Está sendo difícil perder-te finalmente sem nunca te ter tido.

Você foi tanta coisa que às vezes acho que te amo. Mas nunca saberemos realmente.


Comentários